Como combinar ciência, conhecimento ancestral e transformação digital em prol da saúde pública? Essa foi a proposta apresentada por João Paulo Souza, diretor da BIREME/OPAS/OMS, durante o seminário Saberes do Cuidado, realizado nos dias 8 e 9 de abril, em São Paulo, como parte da programação do SESC Inspira, que celebra o Dia Mundial da Saúde com atividades educativas e culturais em suas unidades.
Organizado pelo Serviço Social do Comércio (SESC) de São Paulo – uma instituição brasileira dedicada à promoção da saúde, cultura, educação e bem-estar social – o evento reuniu mais de 200 participantes, incluindo profissionais de saúde, formuladores de políticas locais, funcionários de várias unidades do SESC e o público em geral. O seminário também contou com a presença de acadêmicos renomados, profissionais de saúde e curandeiros tradicionais, refletindo uma abordagem intercultural do cuidado e do conhecimento.
Em sua intervenção, João Paulo Souza compartilhou o progresso na construção colaborativa da Biblioteca Global de Medicina Tradicional da OMS (Traditional Medicine Global Library, TMGL), uma iniciativa liderada pela BIREME e pelo Centro Global de Medicina Tradicional da OMS (WHO GTMC), em articulação com outras instituições e redes colaborativas.
Souza ressaltou que a transformação digital tem o potencial de ser uma grande aliada do conhecimento tradicional: “A transformação digital pode ser uma aliada da ancestralidade quando é utilizada para preservar, conectar e proteger o conhecimento dos povos. A partir desta perspectiva, é possível desenvolver bases de dados multissistêmicas para identificar práticas seguras, eficazes e culturalmente adequadas inspiradas na sabedoria tradicional.”
A TMGL foi apresentada como uma infraestrutura digital colaborativa e descentralizada, projetada para integrar conhecimentos, práticas e sistemas de cuidados tradicionais de diferentes regiões do mundo, em diálogo com uma abordagem científica contemporânea. Concebida a partir de uma perspectiva multissistêmica, a biblioteca busca articular o conhecimento ancestral com a ciência moderna e as tecnologias digitais, promovendo o respeito intercultural, a equidade em saúde e a sustentabilidade. De acordo com Souza, esta abordagem abre a possibilidade de enriquecer as políticas e práticas de saúde pública, integrando diferentes racionalidades médicas sob critérios de segurança, eficácia e relevância cultural.
Souza explicou que a TMGL incluirá um portal global, seis portais regionais e coleções nacionais e temáticas, como Ayurveda, medicamentos indígenas, medicina ancestral africana e medicina afro-diaspórica, entre outros. Suas funcionalidades incluem acesso a bases de dados científicas, mapas de evidências, preservação digital do conhecimento tradicional, proteção da propriedade intelectual coletiva de povos indígenas e comunidades locais (PICL). Tudo isso com o objetivo de fortalecer a tomada de decisões informadas e culturalmente apropriadas em políticas públicas e sistemas de saúde.
Durante sua apresentação, o diretor da BIREME também destacou o desafio de promover um diálogo epistêmico respeitoso e produtivo entre os diferentes sistemas de conhecimento: “O desafio é como garantir o acesso universal, inclusivo e respeitoso a estas práticas, reconhecendo seu valor comunitário, ancestral e espiritual, ao mesmo tempo em que se identificam aquelas que são seguras, eficazes e culturalmente apropriadas para fortalecer os sistemas de saúde a partir de uma perspectiva pluralista”, afirmou.
A apresentação foi concluída com um apelo à colaboração, enfatizando que a TMGL é um bem público construído coletivamente, cujo desenvolvimento depende do compromisso conjunto de redes, comunidades, instituições e tomadores de decisão: “Nada se constrói sozinho. A TMGL será um bem público, resultado da colaboração entre redes, comunidades e instituições.”

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